Translate

sábado, 30 de novembro de 2013

Conversas em silêncio

Começou a época das festas, este ano tenho festa de ano da neta, Natal e Ano Novo, adoro. Só de pensar já fico cansada, mas feliz. Tenho que esperar, não posso pensar já em tudo, tenho que ir pensando devagarinho, aliás como eu gosto, devagarinho. A primeira festa onde vou é ao jantar de Natal do jornal para onde escrevo mensalmente há mais de 20 anos, Meu Deus! Nesse dia à mesma hora tinha o jantar do Centro de Saúde, não posso estar em dois sítios ao mesmo tempo, terei que estar naquele para que fui convidada primeiro. Depois tenho a festinha do 1º ano da neta, acho que vai ser cá em casa, já pensei na ementa, nas prendinhas, mas não posso pensar muito porque os pais ainda não decidiram bem, por isso aguardo e guardo os pensamentos! A seguir vem o jantar e a noite de Natal, passamos todos juntos, depois o dia de Natal nós ficamos os dois sózinhos, com o Vicente, a Carlota, o Fred, a Sarita e a Preta. A passagem de Ano, ainda que me apetecesse muito sair, podia até só ser um pequeno cruzeiro que passa pela Madeira, ou ir até à Turquia, ou mesmo Londres, qualquer volta para renovar a energia do casal, acho que temos que a renovar aqui em casa, porque trabalho de manhã, e não tenho mais férias para tirar, nem mais dinheiro para gastar. Pode ser bom, sentadinhos no sofá, com os animais nossos amigos!
Hoje fizemos as primeiras compras para a noite de Natal, prendas já muito pensadas, levei bem um mês a fazer a lista, a pensar em cada um, na carta de Natal, no menú, na forma como decorar, um sem fim de actividades, penso tanto que quando vou efectuar tudo o que pensei, quer me parecer que já fiz, mas só o fiz na minha imaginação! Amanhã se for capaz faço a árvore de Natal, depois temos que ir ao musgo para fazer o presépio, enfim uma trabalheira, mas que me dá muito prazer. Na verdade o que precisava era ter esta semana de férias para poder fazer tudo com muita tranquilidade, como não pode ser, tenho que fazer um bocadito mais à pressa.
Quero que a energia se renove, sempre senti isso na minha casa, a minha mãe também pensava nas actividades todas que eram necessárias, quando era altura tornava-se tudo mais fácil. Já a minha avó Maria Antónia fazia o mesmo, para coisas simples, por exemplo:
- Então o que vai ser a comida amanhã Pató (era assim que ela era chamada pelas madrinhas, a minha avó vivia com as Madrinhas, o meu avô vivia com a gente, às vezes dormiam juntos)?

- Minha Madrinha, podia ser o coelho frito, o meu Padrinho gosta tanto e o menino também!
- Sim, para o jantar. Para o almoço até podia ser uma açordinha, não acha?
- Podia, mas talvez o coelho para o almoço, e para o jantar um guizadinho, ou o meu Padrinho vai trazer lampreia?
-Acho que não, se calhar mais perto do Natal! Mas pode ser, e os doces?
blá, blá, blá
Era uma conversa sem fim, sobre a comida, a roupa, o que mudar em casa, ou  a prima Joaquina que não tem aparecido, se calhar temos que ir lá a casa, e eu calada, a ouvir, ouvir, ouvir, tranquilamente, às vezes era uma conversa tão saborosa que até salivava!!!
Agora penso, penso sózinha silenciosamente, ninguém tem paciência para esse tipo de conversé, mas eu tenho e às vezes sinto-me sózinha.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Conversas

- Maria, gosto tanto de ti!
- Cala-te Luís, cala-te... andaste a beber?
E havia sorrisos, dele porque estava desinibido e dizia o que lhe ia na alma, doutra forma não tinha coragem, dela porque gostava de ouvir, sorria, mas ao mesmo tempo tinha vergonha, sorria até com os olhinhos, que eu bem via por detrás dos óculos.
Era assim todos os domingos, o meu avó almoçava, dexia a rua, ia até ao café da rua do ribeiro, ficava por lá um bocadito e a meio da tarde voltava para casa, cara avermelhada, sorriso nos lábios e as palavras sagradas:
-Maria gosto tanto de ti!
Eu ao princípio ficava sem jeito, achava graça, mas pouco, não gostava de vê-lo com um grãozinho na asa, e durante muitos domingos limitava-me a ficar com o meu avô, ao fim da tarde, ao canto do lume, a ouvir na televisão a preto e branco, a conversa do Vitorino Nemésio - Se bem me lembro. Muitas das conversas eu não percebia, gostava da entoação das palavras é certo, era musical essa entoação, com um sotaque açoriano lindo, um rosto de tão feio tornava-se bonito, e poder ficar com o meu avô sossegadinho, ali os dois juntinhos, dáva-me uma certa paz e uma sensação de controle; mais tarde comecei a tomar a iniciativa de ir ter com ele ao café e antes que ele bebesse convidáva-o:
-Avô vamos, está na hora do programa!
-Já?
-Sim, falta pouco, vamos andando.
-Estás a enganar-me para me levares daqui?
-Não, é verdade, já falta pouco para o programa, vamos para casa!
E lá íamos os dois, o meu avô deixava que eu o enganasse,  e eu senti-me feliz por ter impedido mais um sorriso nos lábios e a eterna e deliciosa frase:
-Maria, gosto tanto de ti!
Estes domingos sucederam-se durante anos, acho que foi por isso que um dos meus escritores preferidos sempre foi o Vitorino Nemésio e tenho saudades das conversas dele - Se bem me lembro. Era uma conversa sem fim nem principio, que podia começar numa frase ouvida na rua até à Odisseia de Homero, ou a qualquer outra importante obra de arte literária ou outro qualquer tema, interessante ou não, porque na verdade o que era realmente interessante era a conversa só por conversa.
Talvez seja por isso que eu gosto de conversar só por conversar, sem tema pre definido, ou com tema, conversar faz-me bem à alma, e se a conversa for com as filhas ou o meu PQ, até que a minha neta me dê conversa, eu espero, é muito bom. Quando isso não acontece e enquanto espero pela neta, venho conversar aqui, mesmo que esta conversa seja de mim para mim.
-Maria, gosto tanto de ti!
-Cala-te Luís, cala-te, valha-me Deus, já bebeste?

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Pas de deux

Continuamos a não ter livro de instruções para as nossas actividades de vida diária, o que de certa forma nos causa algum transtorno. Se existissem instruções, nem que fosse para as actividades mais banais, facilitava bastante, e então se fossem instruções para " boa convivência entre pessoas" era oiro sobre azul. Sei que é difícil para muita gente viver em sociedade, mas para mim às vezes torna-se deveras complicado, entusiasmo - me com facilidade, para agravar a situação sou um bocadito surda, de modo que às vezes o entusiasmo não tem nada a ver com a conversa que os restantes elementos do grupo estão a ter, e dou por mim a receber olhares confusos!!! E eu feliz por falar, falar, falar. É uma situação que não parece ser difícil de solucionar, não fora a minha recusa em adquirir um aparelho auditivo. Sinto que quando fizer essa aquisição dei um passo, um passo não, um salto para a minha verdadeira velhice, sei que tenho que fazê-lo, amanhã penso nisso. Como se não bastasse ouvir mal, acho que sou detentora de toda a verdade, de todos os casos interessantes, eu é que sei dizer graçolas, na verdade primeiro estou eu, depois ainda na verdade estou eu, depois um bocadito mais ainda para mim, e então tranquilamente dou a palavra ao meu vizinho. A dificuldade que tenho em alterar este estado de espírito é brutal! Esta tendência comportamental, esta neurose e como não tenho livro de instruções estou a deliniar estratégias diárias consoante a situação em que me encontro; se estou numa reunião cheia de gente, a primeira frase que escrevo na folha que obrigatóriamente tenho à frente é: mantêm-te em silêncio. É de tal maneira a necessiadde de me conter que escrevo repetidamente a frase, como se de apontamentos se tratasse e dou por mim a ter ainda mais dificuldade em tomar atenção ao palestrante, no fim fico contente por ter cumprido o objectivo: mantive-me em silêncio! Mas fico com a mágoa dentro de mim-tanta coisa que me apetecia ter dito e que podia ter dito e afinal mantive-me em silêncio! Sempre ouvi dizer que o silêncio é de oiro, mas é pela palavra que caminhamos, quer queiramos ou não, a sabedoria está em saber fazê-lo. Tanto curso que fiz, tanto que tenho lido, para chegar à conclusão que devo manter-me calada o mais possível, e treino-me para conseguir atingir essse objectivo.
Quando durmo no entanto, se calhar estou mais à vontade, e então um dos últimos sonhos que tive foi delicioso. Fui fazer uma audição para trabalhar como bailarina, ballet clássico, fiz alguns passos, pas de deux, piruetas, elevações, etc.. e fui contratada. Venho para casa e com uma alegria imensa digo ao meu PQ:
-50 anos, 50 kg e aceitaram-me!!!
- E agora?
- Então agora vou 15 dias para Londres para aperfeiçoar pequenas coisas e começo a integrar o ballet da companhia!
Senti, um sorriso imenso na alma, consegui vencer no mundo da dança! Mais um objectivo cumprido, ao menos a dançar mantenho-me de certeza em silêncio, mesmo que seja só em sonhos!

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Dentadas públicas

Estou com uma gripe terrível, continuei no entanto a ir trabalhar, contra todas as recomendações da boa evidência médica; tinha tantas crianças marcadas, não tinha como as atender antes do ano terminar, que resolvi ir, como não há Medicina do Trabalho que vigie esta gente doida como eu, que vai trabalhar doente, atender crianças saudáveis carregada de gripe, fui. Depois, à tarde tinha reunião de orientadores, internos de Medicina Geral e Familiar,  Internos do Ano Comum, Internos de Saúde Pública e respectivos orientadores. Não foi nada bom para a minha Interna que apresentou um trabalho sobre a Obesidade Infantil, em 20 minutos, ela que não é Portuguesa, fez tudo sózinha sem a minha ajuda, sem qualquer erro de ortografia, com uma boa dicção, um bocadito à pressa porque fez 50 slides para 20 minutos. Levou com algumas críticas justas, mas a maioria foram críticas desajustadas ao que ela pretendia mostrar, que era tão só, como melhorar a técnica de explicar aos cuidadores das crianças, pais, pessoal da saúde e professores o que é a obesidade e como devemos falar dela, corajosamente, logo na mulher grávida. Foi um horror, a pequena não aguentou e saíu da sala, chorou, sentiu-se traída, não consegui fazer ouvir a minha voz, até porque a gripe ma roubou.
No final percebi que as críticas que foram dirigidas a ela, tinham como alvo principal, eu, era exactamente eu, porque é assim que eu costumo ser, demasiado exigente com todas as apresentações de toda a gente; no caso dela, não fui mais exigente, primeiro porque não tivemos tempo, depois porque estou de facto doente, depois porque a minha neta ainda não está bem, melhorou um pouco, mas obviamente estou muito preocupada, de modo que não lhe dei a devida atenção, e também achei que para o objectivo que ela tinha traçado, estava muito bom. Eles acharam que não e expressaram-se como se expressa um cão, quando vê um gato desconhecido, à dentada, a rasgar, até ferir profundamente.Devo ter errado muito no passado para ter concentrado tanta raiva contra mim, as pessoas deviam ser mais educativas, não tinham que errar como eu tenho feito. Por mim aprendi, e faço como sempre faço quando levo na cabeça: obrigada, assim aprendo mais depressa, dóie mais, mas ao ficar mais presente a dor na alma, não vou esquecer, na próxima vez que estiver numa reunião desta natureza, vou ter muito cuidado com o que digo, como o digo, e a quem o digo, com que intenção o faço. Os nossos melhores amigos são aqueles que nos mostram caminhos, não são os que nos batem nas costas e estão sempre de acordo com o que faço, queria que ela, a minha interna fosse capaz de aprender com os nossos erros e com os erros nossos reflectidos nos nossos colegas, eles fizeram o que eu tenho feito, eu ensinei-os mal, vou ter que voltar a fazer o trabalho de casa, ensiná-los melhor, ainda que à custa de muito sofrimento. São muito pouco imaginativos para terem as mesmas atitudes que eu tive, eu não sou assim tão importante, para copiarem o meu comportamento. Amanhã será outro dia, queria tirar de cima dela todo o sofrimento que infelizmente lhe causei, involutáriamente.
Aprendi que o amor tudo vence, que se for preciso darei a outra face, preciso é que a minha neta fique boa. A minha gripe até pode continuar, mas a minha neta tem que melhorar; posso não ser a melhor orientadora desta vida, mas em cada dia tento melhorar, porque quero ensinar à minha neta que só o amor é vida.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Detalhes

Estou com uma amigdalite, a minha neta está com intolerância à lactose - talvez - só sexta feira vamos saber, a minha filha está cansada, o Fred melhorou da obstipação depois de ter passado 2 dias internado na veterinária, a Carlota está melhor da sua dermatofitose. Para o ano que está prestes a findar não está mal, só falta mesmo é a minha querida menina, neta amorosa, ficar melhor. Acho que nos preocupamos um pouco mais com os netos do que me lembro das preocupações com as filhas. A minha filha mais velha, mãe da minha neta querida esteve na Estefânia com a titi, ainda com uns 15 dias de vida, porque a sua querida mãe que sou eu, a vestiu muito em pleno Verão, e apesar de lhe oferecer água no biberon a filha não bebia. Fomos para o hospital, passou a noite com um cateter na cabeça para hidratação! Porque é que ela não bebia água pelo biberon? Porque antigamente as tetinas não tinham o buraquinho feito, era preciso ser feito por nós com uma agulha quente, nós não sabíamos. Pois bem, nessa época eu já era médica, só que ninguém me tinha explicado a importância de verificar pequenos detalhes.
Não sei o que aconteceu com a minha querida pimpolha, sei que vai melhorar, sei porque sim e também porque está mais uma vez a titi a supervisionar!
Amanhã espero que a minha pequenina já tenha comido melhor, sei que a minha filha sua mãe está mais atenta do que eu estive, mas não deixo de sentir um apertozinho no meu coração, quero a minha neta a crescer saudável e já! Nestas, como noutras alturas, faço as minhas preces, sinto que sou ouvida; é ser velha ter esta maneira de pensar? Não sei, o meu pai rezava muito e ajudou-nos sempre, não tenho a sua sabedoria, nem a sua fé, mas tento à minha maneira, e isso é já um caminho.
Hoje não dá mais, a minha grande preocupação e toda a minha atenção estão junto da minha neta, e à minha maneira "estou-lhe mandando boa energia" amanhã vai ser outro dia.


sábado, 2 de novembro de 2013

Equívocos

Educar os nossos filhos não acaba nunca, parece que cada dia é preciso reinventar, adequar novas estratégias para os fazer encontrar a "vereda". Chamo vereda ao caminho que todos temos que fazer, diariamente. Só nós podemos fazer o nosso caminho, sempre me senti bem ao lado dos meus pais nesse percurso, mesmo quando já era mãe, nunca me fizeram sentir que me estavam a ensinar, ensinando-me a cada momento. Havia até alturas em que eu me sentia tão importante junto deles, a explicar-lhes coisas, sentidos, palavras carregadas de emoções; havia até alturas em que recebia estes mimos, quer do meu pai quer da minha mãe: é tão bom conversarmos contigo, diziam eles, nunca pensei que chegássemos a ter assim conversas tão boas! Como eu ficava contente com estas doces constatações, pensando que tinha chegado ao coração deles, ao melhor dos conhecimentos, mas na verdade o que tinha acontecido é que eles me proporcionaram esse caminhar nas emoções, foi através dessas conversas que cheguei a mim, eles sempre me ajudaram a melhorar o meu conhecimento, sobretudo sobre mim. Hoje anda numa tarefa semelhante, de ouvir as filhas, mas ainda não tenho a sabedoria de dar a entender que estou a aprender, parece que continuo a ensinar e na verdade já devia estar quase e só a ouvir; vamos ver como vai correr o dia amanhã. A filha vem trazer a cadelinha, não estão a conseguir viver em paz, é muita tarefa para fazer, tomar conta da neta, da casa e agora da cadelinha; fiquei triste mas compreendo e devia ter tido a esperteza de ter avisado que era muita coisa para início de vida, não tive essa esperteza, vou ficar com mais a chica cá em casa; tenho o Vicente, a Carlota, a Sarita e a Preta, amanhã fico também com a Chica, se a lei do número de cães fosse para a frente estava no limite, tenho 4 cães a partir de amanhã, esqueci-me de enumerar o Fred, foi adoptado com 5 anos, porque a dona era já muito velhinha e não podia ficar com ele; agora a dona é muito novinha e também não pode ficar com ela! O Vicente também o trouxe para casa porque a minha mãe não o quis, o meu pai tinha falecido e achei que um cachorro podia ser uma boa companhia, enganei-me!

A nossa caminhada é feita de equívocos, sempre pensei que ao crescer, ia a pouco e pouco vivendo com menos erros, mas não, a vereda da vida é repleta de erros, amanhã temos um novo dia, que seja bom.