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terça-feira, 16 de setembro de 2014

Chama a empregada

A saída do hotel estava marcada para as 5h e 30m da manhã, obrigava a deixar tudo arrumado de véspera e levantar às 4h e 30m, sabemos os dois que necessitamos de uma hora para nos prepararmos para sair sem tomarmos o pequeno almoço. Assim fizemos, despertador do telemóvel ligado, pedido na recepção para nos acordarem à hora prevista, um pãozinho com queijo arranjado ao jantar e toca a dormir. Na verdade deitá-mo-nos à hora habitual, ainda fomos assistir ao espectáculo do hotel que se chamava : o Sultão. Compreendia um corpo de baile engraçado e a história foi contada em Inglês difícil, um Inglês com sotaque Turco, mas deu para perceber que houve uma luta por umas terras, raptaram as raparigas para o harém do Sultão, obviamente escolheu a mais bela, a pobre estava apaixonada por um dos bárbaros que fazia parte dos empregados do Sultão que as raptaram. Se não era assim, foi assim que entendi. Muitas peripécias pelo meio e a moça lá acabou queimada numa enorme fogueira, mais umas danças que faziam lembrar as danças da URSS, portanto não sei a que país agora pertencem e o dançarino que roda e a saia também roda durante uma infinidade de tempo sem cair tontozinho para o lado. Foi bom de ver, gostámos e toca a ir para a cama, porque o tempo ia ser escasso para uma noite reparadora, mas tudo bem, as saudades da neta, das filhas e do genro, mais da casa e dos nossos queridos animais nossos amigos  eram tantas, que não fazia mal nenhum o tempo ser curto.
A manhã chegou logo, por acaso eu acordei na altura em que a recepção telefona, tudo calmo e tranquilo. Efectuado o check out, esperámos tranquilamente no hall exterior do hotel pelo transfere, tudo a horas, chegámos ao aeroporto com tempo mais que suficiente para fazer o chek in, tomar o pequeno almoço, dar uma vista de olhos às lojas e embarcar, sem stress.
Durante o caminho entre o hotel e o aeroporto verifiquei com agrado que a via rápida tinha imensas estações de serviço, abertas, com muitas luzes, o que me descansou não fosse ter um daqueles imprevistos intestinais que obrigassem a uma paragem estratégica. A viagem foi tranquila. Tomámos o pequeno almoço, meia de leite com café turco, pois claro, eu comi o pãozinho com queijo que levava na mala e ainda fui dar umas dentaditas no bolo do meu PQ mas que não me caiu muito e até comi pouco. Na sala de embarque parece que o meu estômago começou a dar um pequeno sinal e resolvi tomar uma água mineral que na verdade ajudou pouco e lá fomos pela manga tranquilamente para o nosso lugar, o número 7, bem à frente graças a Deus e aos Céus. À nossa frente 2 filas de bancos e depois a classe executiva. Calma e tranquilamente, cinto colocado, livro pronto para quando o avião estabilizasse começar a leitura, a viagem até Istambul era cerca de 55 minutos, nada de grave e se há coisas que eu gosto de sentir é o avião a levantar, foi sempre a parte que mais gostei. Parecia-me no entanto que o meu estômago continuava a querer dizer-me que não estava muito bem e puxei do saco do enjoo para estar preparada para a eventualidade nada provável aliás de vomitar, mas uma mulher prevenida vale por duas.
O que se passou a seguir não sei o que foi, mas a sequência foi mais ou menos esta:
A má disposição aumentou à velocidade da luz e acompanhando as náuseas com uma baba já a escorrer para dentro do saco do enjoo o intestino avisou-me que estava prestes a soltar-se, a acompanhar estas sensações comecei a ficar cheia de suores frios e prestes a desmaiar, o avião estava a levantar voo e eu a desmaiar! O meu PQ sem saber o que fazer olhava-me com um ar de aflição e com um pedido mudo, só quem conhece sabe:
Ele - Por favor,aguenta-te...
Eu - Chama a empregada, em estilo de suplica
Ele - Aguenta-te...
Eu - Chama a empregada, quero deitar-me vou cair do banco.
Desabotoei o cinto de segurança, dei de caras com a hospedeira que estava sentada e que com a mão me pede, também ela, whait!!!
Eu - Chama a empregada, chama a empregada...
E continuei a chamar a empregada, mas continuava sentada no banco a escorregar, a sentir-me a babar e o intestino prestes a explodi no banco!!!! Ninguém está a perceber que eu vou fazer tudo neste banco e que isso vai ser um desastre de porcaria e mau cheiro???
Quando achei que o meu mundo ia acabar o comandante diz qualquer coisa pelo altifalante, a hospedeira está à minha beira e eu sussurro suplicando: bathroom please!
Ela pega-me pelas axilas, mais 2 rapazinhos fardados um de cada lado, o meu PQ atrás da hospedeira e todos os olhinhos que havia e não havia no avião, olhando-nos. Graças aos céus que a casa de banho estava ao alcance de duas dúzias de passos, entrei, tive tempo de tirar a cuequita, sentar-me e encostar-me à bacia da casa de banho e nesse momento senti que todos os anjos e arcanjos, Deus e os meus antepassados estiveram comigo neste momento de loucura. A porta ainda aberta da casa de banho e já eu me ia sentindo aliviada... o meu PQ quase se vomitava com o cheiro, mas foi  empurrado pela hospedeira para dentro da casa de banho, que uma alma caridosa fechou, porque o cheiro fétido de alguém que não defecava há meses estava paulatinamente a invadir o corredor da classe executiva e ia caminhando avião fora. Não sei quanto tempo ali estivemos os dois, o meu PQ aguentou estoicamente com um sorriso nos lábios, e de vez em quando uma náusea mais sonora que ainda suspeitei poder tornar-se em vómito, enfim lá estivemos os dois fechados. Passado o mau tempo, saímos com a sensação do dever cumprido, não tínhamos sujado nada, foi um momento limpo.
Ao sentar-me num banco só para mim, a convite da hospedeira percebi que tínhamos iniciado a descida, ó Deus dos Céus porque me abandonais....pouco tempo depois, levanto-me e sussurrando digo no meu melhor Inglês:
Bathroom please.
Resposta pronta do rapazinho que ia sentado junto a ela, a qual já estava trancada porque estavamos em descida, ele com um sorriso amarelo nos lábios, sem mais perguntas: please, come in.
E lá entro novamente para aquele delicioso cubículo até o avião quase chegar à pista, felizmente sem ter feito qualquer porcaria, senti-me feliz, sou uma mocinha muito asseada.
Avião na pista, sacos nas mãos e lá saímos do avião com a benção deles todos que finalmente se viram livres de nós.
A pouco e pouco as forças voltavam e eu cada vez a sentir-me melhor, entrei no aeroporto de Istambul, fizemos tudo o que precisávamos e ao aperceber-me que havia uma pequeno bazar à vista corri para ele e iniciei as penúltimas compras, muito mais bem disposta.
Pareceu-me que de vez em quando, alguém cochichava ao ver-me passar, mas na certa era desconfiança minha, ninguém me ficou a conhecer, ninguém mais se vai lembrar de mim, se Deus quiser.