Desde há cerca de 20 anos que escrevo para o nosso jornal aqui da vila, desta vez apeteceu-me transcrever o artigo que escrevi para o mês de Abril de 2014.
"A Nossa Saúde
Repetir é uma das formas que temos para aprender, fazemos isso em
crianças, para aprender as primeiras palavras, fazemos isso para decorarmos
matéria para os exames, continuamos a repetir-nos quando temos mais idade, para
não esquecermos. Não faz mal repetir, falar e falar sobre o que nos atormenta
ou pelo contrário, falarmos das coisas que mais adoramos ou até das que nos
metem medo. Comemorar datas, aniversários, épocas festivas religiosas ou pagãs,
Natal, Páscoa, equinócios ou carnavais, são importantes para nos libertarem da
rotina, para nos fazerem acreditar que há mais vida para além do défice, da
corrupção de influências, das burlas económicas / financeiras, dos ajustes
orçamentais que acabam sempre na redução de salários, pensões e afins.
Abril é mês de revolução, passados 40 anos, é preciso continuar a repetir
e a falar da liberdade, das conquistas, das perdas, dos ganhos, dos sonhos,
porque sonhar é preciso.
Em cada dia que passa, sou confrontada cada vez com mais frequência com
sonhos perdidos, com vidas destroçadas, com dores e lutos, então preciso
agarrar-me a sonhos para poder lidar melhor com a realidade que me entra
consultório dentro.
Partilhar faz bem, por isso partilho. Não sei como ajudar a resolver uma
das últimas questões que me foi dado tomar conhecimento:
- F.P. homem com 68 anos, com cancro do colon, colostomizado, a viver
sozinho, numa habitação que ainda não visitei, mas que sem grande esforço imagino,
com uma higiene deficiente, procura-me por dor forte no membro inferior
esquerdo. Depois de ter efectuado o exame objectivo, confrontei-me com um
emagrecimento marcado, de ter o diagnóstico agravado com uma anemia
ferropénica, de ter decidido a terapêutica para a dor que o trouxe à consulta,
olhando bem para ele percebi que estava triste demais, por isso ficámos mais um
pouco e conversámos sobre a vida, a sua vida, a sua solidão, e sugeri:
- E se fosse passar um tempo com o filho?
-Não, não posso, ele tem uma casa muito pequenina, só tem 2 quartinhos,
tenho 2 netas, não pode ser!
- Então e se fosse passar o dia ao Centro de Dia tinha companhia,
tratavam-lhe da roupa, da comida, sentia-se talvez melhor senhor F.P.
- Não senhora Doutora!
Choramingando, continua em surdina:
-O meu filho está desempregado, o dinheiro que tenho da pensão é para
ele!
E ficámos em silêncio.
É preciso repetir, tantas vezes quantas as necessárias, para aprendermos,
para decorarmos, para não esquecermos."
Cada um de nós tem cerca de 30 histórias para contar ao longo da nossa vida, parece que eu vou arranjado um pouco mais.
Ultimamente tenho tido dias com muita preguiça, muito cansaço e o sono agarra-me em cada momento em que me sento para descansar. Espero com o chegar do Verão que as coisas melhorem, o tempo quente sempre me fez bem, e as tardes no meu quintal dão anos de vida. Vamos ver!
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