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segunda-feira, 13 de maio de 2013

Chamadas

Não tenho meio termo, gosto ou não gosto, faço ou não faço, tenho medo ou atiro-me de cabeça, tudo onde estou é de corpo inteiro, nunca estou assim de passagem, sem me envolver muito, só tomando atenção e apenas a conversar com os meus botões. Quando vejo o esforço que a minha neta faz para entrar na conversa, para começar a participar nas actividades de vida diária, tenho muita vontade de lhe explicar: minha querida este é o momento em que observas, em que estás atenta, em que toda a gente tem atenção a todas as tuas necessidades, em que todos te damos colo, te damos beijos, amor, em que deixamos o centro do mundo só para ti, aproveita; mas não digo nada, claro, e a minha neta continua na procura incessante do auto-controle. Quem me dera ter auto-controle e fazer o que podia fazer quando era pequena: prestar atenção, e não fazer nada mais.
Esta manhã tive tanta preguiça, senti-me tão cansada. Ora bem, cansada logo de manhã, sem vontade de ir trabalhar quer dizer que estou pior da minha preguiça? Acho que estou pior sim, mas o tempo passa tão depressa que assim também não vale a pena, viver à pressa não é para mim; tanto que eu esperei pelo fim-de-semana, foi óptimo, adorei, mas tem sempre o mesmo defeito, passa depressa de mais, quando dei por mim era hoje de manhã, conclusão, fiquei deprimida, na verdade não há quem aguente, sinto tanta falta de tempo de antigamente. A minha avó Maria Antónia tinha o tempo todo do mundo, fazia tudo devagar e muito bem feito, adorava quando a ouvia conversar ao telefone com a prima dos correios, que fazia as ligações das chamadas que a minha avó precisava:
-Minha prima como está?
-Pató há tanto tempo que não ligava!
-É verdade minha prima, mas não tenho tido ocasião; agora que sairam todos vim aqui conversar um bocadito e aproveitar para ligar à Dona Anica, a minha prima faz a ligação?
-Claro Pató e como tem andado? E os padrinhos? Ouvi dizer que ....   
E a conversa entra a minha avó, Pató para toda a gente menos para mim, continuava. Muitas vezes a ligação que era pedida no início, não era feita, a conversa estava tão agradável! Naquela tempo eu ficava a ouvir, calma e tranquilamente, a conversa telefónica entre a avó e a prima dos correios a quem toda a gente pedia as ligações telefónicas interurbanas e outras que tais; em Cabeção, no início havia meia dúzia de telefones, todos tinham que pedir as chamadas, agora quem nos faz as chamadas? quem nos pergunta e comenta : há tanto tempo que não ligava! O tempo para estar ao telefone não existe, o tempo para estar no quintal a conversar com as madrinhas, a prima Joaquina e a menina Carmo, há muito que passou, de modo que quando tenho fins-de-semana com visitas das minhas queridas e das suas amigas fico toda contente muitos dias antes, quando o fim-de-semana chega evapora-se num instante, quase nem deixa sabor, o que vale é que fica no meu coração o sorriso da minha neta e tudo o que gira à sua volta, pais, tios, avós amigos e os animais nossos amigos.
Espero amanhã de manhã estar melhor, escrever estas linhas deu-me alento para mais um dia, recordar é realmente viver.

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