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quinta-feira, 3 de maio de 2012

Cada qual com seus pés

A idade não perdoa, mas a verdade é que são escolhidos para partirem para a última viagem, os melhores; os velhacos ficam sempre, partem sempre primeiro os melhores. Os meus Pais partiram, o meu Sogro já partiu, ficou a minha querida Sogra. Tenho pena dela, não come, não saie, não fala com ninguém, está deprimida. Foi medicada pelo seu médico de família que não tem perdido muito tempo com ela a entendê-la e, tem sido mais fácil medicá-la, cada vez mais e melhor. Agora estamos a desmamar a medicação, mas hoje é o 1º dia, amanhã já vai ser melhor, senão o meu PQ cada vez fica mais nervoso, incontrolável. Quer por força ser considerada doente, e é, da cabeça. Tem os valores analíticos normais para a idade, está sequinha que nem um carapau, mas tem uma ruindade dentro dela, que não consegue ver mais além. De tal modo que até me tolda a capacidade de escrever. Vamos sempre andando, hoje estava agoniada, ficou assim depois de comer o ensopado que a Zulmira fez, estava salgado!! A minha Zulmira que cozinha práticamente sem sal, o meu PQ comeu ao jantar e estava como é o costume, muito bom. Disse-lhe: tinha comida feita não tinha? Agradeça e aproveite.
Porque será que à medida que vamos ficando mais velhas vamos refinando o que temos de pior, exigimos que os outros nos dêm tudo e não nos sentimos em falta, por só exigirmos!?
A minha avó Maria Antónia era muito esperta, mesmo bem pequena quando ainda vivia no monte com os pais e as irmãs, sempre conseguiu enganar todos. Pela manhã ficava presa na arca, aquelas arcas grandes onde se guardava tudo, umas arcas eram para a roupa, outras eram para o o pão, outras para os cereais, enfim, não sei que arca era, mas ficava com os pés presos, a irmã Albertina ficava aflita e dizia-lhe: Maria, ficaste presa outra vez, e agora a mãe chega e não temos a casa arrumada? A minha avó devia fazer uma carinha, penso eu, consigo até imaginar, e a Albertina continuava: Ai Maria que pouca sorte a nossa, tenta sair daí que eu vou arrumando a casa, doiem-te os pés?
A minha tia Albertina acabava de arrumar a casa e práticamente ao mesmo tempo a minha avó Maria Antónia, milagre, ficava com os pés libertos. A minha avó faleceu com uma demência grave, relativamente nova, muito amada pelo seu Luís e por todos nós, especialmente o meu irmão que a considerava mãe, e a minha tia morreu já mais velha, boa da cabeça, praticamente sózinha, o filho António Pereira morreu antes dela, e a Celeste a filha mais nova, está no Lar, sempre foi um bocado atrasada, nunca foi capaz de casar, o que para essa altura era uma tragédia, mas a minha tia Albertina faleceu quase sózinha, arrastando os pés, recordo-me dela sempre a arrastar os pés. Porque será que me lembrei desta história e em que é que isto tem a ver com a situação de depressão da minha Sogra? Devo estar então muito cansada. Amanhã conto mais histórias.

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