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quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Visitas

Antigamente, visitar os amigos e os familiares doentes era uma coisa banal, porque se fazia com muita frequência, e banal só por isso. A visita cumpria certos rituais, primeiro saber quem precisava de ser visitado, a minha mãe ou mesmo a minha avô sentia e fazia-me sentir da necessidade da visita; depois a escolha do dia mais apropriado e da hora mais conveniente, mandar saber se a visita seria bem recebida, se a pessoa a quem se destinava se sentiria bem com a nossa presença, depois de todos estes Ses, que sabámos rápidamente, não havia telefones com há agora, para já não falar em telemóveis, mas havia sempre gente pronta a fazer "recados". Preparavamo-nos para a visita, com uns bolinhos, ou um cesto de fruta ou mesmo qualquer bordado ou doce caseiro, compota, qualquer mimo, ir sem nada nas mãos era muito feio, era uma falta de respeito. Chegado o dia, e perto da hora, preparavamo-nos com uma roupa mais adequada, própria para a ocasião, nem demasiado simples nem demasiado fina, sapatos limpos, cara lavada e bem penteada, uma pequena carteira de mão com um lenço de assoar bordado algumas moedas e a chave de casa, era a carteira da mãe ou da avó, eu levava a prenda e nada mais, apenas as recomendações especiais: cumprimentar os presentes depois dos crescidos, ficar sentada na cadeira que lhe destinarem, nunca na cama do doente, não mexer as pernas que costumavam ficar penduradas na cadeira e na altura do lanche, havia sempre lanche, saber comportar-se; não falar sem primeiro lhe dirigirem a palavra e saber sobretudo esperar, sem mostrar que está a bisbilhotar tudo e todos, e esta era a parte mais difícil. Conseguia fazer tudo, comportat-me bem, sorrir e ficar quieta nas alturas próprias, agora não vasculhar tudo e todos com os olhos era-me muitíssimo difícil, e disfarçar muito pior, lembro-me de uma frase que me dirigiram em casa da Tita: fecha a porta do quarto que a Maria Celestina bisbilhota tudo, vai contar tudo à mãe dela! Fiquei tão triste, eu sabia que era verdade, mas podiam disfarçar, senti-me exposta, senti-me despida, nunca mais gostei da mãe da Tita, se calhar foi por isso que briguei algumas vezes com a Lurdinhas, sobrinha da Tita, de quem gostava muito, mas que era pouco bisbilhoteira e eu sabia e sentia que era muito. Isto são lembranças, hoje também fui fazer uma visita, mas já sou mãe e fui com o meu marido, a minha filha mais nova e o seu namorado com ela vive durante a semana, não levei mimo nenhum, não mandei recado, nada fiz como aprendi. Fomos todos visitar a Tia Maria que está há 10 meses a viver num lar que ela odeia, com pessoas que ela não conhece, longe da casa e do flho, onde paga 1500 euros por mês que não entende como está a ser pago, porque o filho nem isso lhe explicou, e quando me abraçou, chorando bem e eu também a primeira coisa que me segredou foi: eu quero ir-me embora, não gosto nada de estar aqui!
Não fui preparada para este tipi de visitas, dóie-me a cabeça, o coração, a alma, dóie-me tudo. Sinto que fiz tudo errado, mas está toda a gente a errar como eu?

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